domingo, 3 de fevereiro de 2008

Gato Vadio (falência de uma civilização)

por enquanto
mantenha as aparências
faça e aconteça
deixe-me morrer então
mas do meu jeito

se te desacato e assombro
com versos de insatisfação
é que divisas nos ombros
terno, gravata ou fardão
cheiram mal sob os escombros
de tua civilização

atrapalho teu sono
como um gato vadio
e do telhado que és dono
ensaio a revolta num mio

gritas por moral e bons costumes
do alto de tua decência
mas não encaras nem assumes
tua própria consciência

passas pela fila indiferente
afinal és o chefe da repartição
tu és um exemplo de gente
e eles, e eles o que são?

tu, como rico ris atoa
mas eles tem motivo pra gemerem
morrendo um a um sob a garoa
não tem mais por que temerem

nos teus discursos, milhões de mentiras
vomitas sobre os ignorantes
não importa a quem firas
leva teus ideais adiante

será que eles sabem
e se souverem hã?
eu só sei que eles sofrem
nesta noite sem manhã

mas numa noite de natal
um mendigo sujo e esfarrapado
um brilho agudo de punhal
um doutor assassinado

vão ser páginas de jornal
hipocrisia em homenagens
mais uma vítima fatal
da violência e outras bobagens

pelo menos o jornal do dia
vai servir de agasalho
pra abrigar a agonia
de um faminto espantalho

adormecido no banco da praça
que agora leva teu nome
entorpecido pela cachaça
que rechaça o frio e a fome

hoje o maldito gato vadio
faz ronda na tua mansão
só durma depois de rezar muito, ouviu!
e alerta bem o teu cão

eu canto a falência
de uma civilização
que jaz na inconciência
de sua alienação

boa noite
durma bem
...miau!

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